terça-feira, 2 de julho de 2024

Uma Estrelinha Franco Brasileira - Publicação 46

Como já citado em publicações anteriores, o nosso Museu de Antigas Máquinas Manuais de Costurar também possui um acervo de quase uma centena de maquininhas produzidas desde 1890 orientadas para entretenimento das meninas, que podiam costurar roupas para bonecas ou pequenos adornos de tecido.


Muitas destas seculares preciosidades foram por nós adquiridas em feiras de rua, em vários países europeus (Portugal, Espanha, França, Itália, Alemanha,..) e sul-americanos. No Uruguai, destacamos a Feria de Tristán Narvaja e, na Argentina, a Feria de San Telmo é imperdível.

Uma descrição mais completa destas “fontes de relíquias” pode ser obtida na Publicação 19 deste blog.

No Brasil, a maioria destas relíquias foram obtidas a partir de sites de venda. Cumpre destacar que várias maquininhas nos chegaram por gentis doações.


Nosso primeiro expositor.

Ainda que por mera curiosidade, frequentemente, busco alguma ainda ímpar nestes sites, embora seus valores tenham exorbitado nos últimos tempos. Desta maneira, há alguns dias, encontrei o motivo desta publicação sendo ofertada, mas graças à exiguidade de tempo para restaurá-la e dificuldade de espaço para guardá-la, concluí por não a adquirir, pois nossos dois expositores estão já repletos, e carecendo de um terceiro. Porém confesso que um fiapo de dúvida ainda permaneceu, comprometendo a negativa decisão.

Nosso segundo expositor

Mas, por vezes, algumas inexplicáveis e surpreendentes soluções apresentam-se, arrematando com epílogo dourado estas tênues vacilações.

Pois, uma pessoa, a quem deposito a minha maior estima, adquiriu a maquininha e, alvíssaras, anunciou presentear-me, assim que ela chegasse.


Chegou um pouco emperrada e oxidada

Em poucos dias recebi, com satisfação, o belo presente. Estava um pouco oxidada, necessitando apenas desmontagem parcial, limpeza geral, aplicação de desoxidante em alguns locais, lubrificação nas articulações e eixos, montagem e regulagem, além da inserção de algumas pecinhas faltantes.


Estampa de máquina similar (gentileza coleção Ana Caldatto)

Consegui a imagem de uma original, “Ma Cousette”, de produção francesa da década de 40 que, embora em deplorável estado, caracterizou a notável semelhança com a recebida. 
 

A original francesa Ma Cousette

Na cópia brasileira, apenas o regulador de tensão foi suprimido, em substituição por mola sobre o carretel, como confirma um antigo manual de utilização, na época ainda desenhado a bico de pena



Antigo manual da “Estrelinha”, apresentando em “1” o regulador implantado.

Até 1930, os brinquedos infantis eram bonecas de pano e carrinhos artesanalmente construídos em madeira. Apenas as mais abastadas crianças recebiam objetos importados da Europa.

Os primeiros brinquedos brasileiros foram produzidos (certamente importados e aqui montados) pelo empresário italiano Ciccillo Matarazzo (Indústria Metalma), durante os anos 30.

E, em 1937, o alemão Siegfried Adler, também residente no Brasil, adquiriu uma pequena fábrica de bonecas de pano e ali iniciou a grande “Manufatura de Brinquedos Estrella Ltda” (depois só com um L), transformada em S.A. no ano de 1944 e reproduzindo, em convênio comercial, centenas de brinquedos oriundos dos Estados Unidos e Europa.

Desde seu início a Estrela produziu mais de 25 mil brinquedos diferentes, num total de mais de 1,2 bilhão de unidades, sendo a maior indústria da América Latina. Porém, em 2004 a empresa teve decretada a absoluta insolvência, acumulando dívidas de R$ 23,225 milhões. 

E, dentre estes tantos, a Estrela fabricou esta relíquia, adaptando a original francesa Ma Cousette (“minha confecção”), entre os anos 50 e 60, mantendo quase todos os detalhes e componentes, incluindo a cor azul. 
 

Nossa linda Estrelinha após leve restauro

O título desta postagem: “Uma Estrelinha Franco Brasileira”, revela um conjunto de homenagens, quais sejam: à indústria francesa que a projetou e fabricou (ainda não identificada) e ao visionário empreendedor alemão, que escolheu o Brasil para implantar a pujante indústria Estrela.

Porém, meu maior preito de gratidão é, ao Prof. Thiago D’Arisbo, ao qual tenho imenso orgulho em ser seu pai, pelo inestimável presente aqui registrado, que certamente será preservado, assim como as outras maquininhas, pelas minhas princesas netas, suas filhas. 
 
Prof. Darlou D'Arisbo

domingo, 31 de março de 2024

A Pequena Notável - Publicação 45

Como já citado nas postagens 32 e 42 (Restauro das Pequenas e Antigas Infantis), o nosso Museu de Antigas Máquinas Manuais de Costurar (MAMC) possui também um grande acervo de máquinas de costurar infantis (1898 a 1970), as quais incentivavam as meninas a desenvolver a imaginação e a criatividade.

Recentemente, num site de vendas de objetos, encontramos a oferta desta que, embora estivesse em deplorável estado, despertou-me a intenção em adquirir e restaurá-la.

Estava emperrada, oxidada e em mau estado geral

E, num site de buscas, encontramos sua completa identificação: trata-se de uma Gateway, fabricada pela Gateway Engineering Company /, Inc., 233 W. Grand Ave., Chicago, Illinois - USA, entre 1933 e 1940.

 


Propaganda da maquininha (1933) e cena da indústria em 1940

Começamos o restauro de maneira convencional: limpeza com querosene para diluir resíduos sólidos de graxas, depois escovação com detergente.

Parte das peças móveis antes da aplicação do desoxidante

Iniciamos a desmontagem de maneira cuidadosa, pois algumas pecinhas são minúsculas e delicadas.  Todas foram submetidas a escovação rotativa de aço em baixa rotação, para retirada de restos de tinta, pois haviam sido submetidas a desleixada pintura e estas pequeninas partes móveis estavam solidarizadas pelo grosseiro tratamento anterior de pintura.  Os apoios de borracha tiveram um leve torneamento para retirar a camada ressecada pelo tempo. 


As pequenas partes metálicas após o tratamento

Um lixamento preliminar com gramatura 100 e depois 400, retirou porções fortemente oxidadas. Conferida a inexistência de mais ferrugem, foi aplicada uma camada de desoxidante (Remox) seguida de outra após secagem da primeira.  Assim como todas as peças móveis, separadamente.



O corpo e a base aguardando secagem do desoxidante

Originalmente, a base da máquina era fixada por sistema de encaixes por linguetas dobradas, porém esta já nos chegou com grosseiras soldaduras, solução que mantivemos, pela impossibilidade de refazer tais entalhes embutidos.



Iniciada a minuciosa montagem

Sua estrutura, após lixamentos de fina gramatura, foi pintada na cor vermelho coral, com esmalte sintético, supostamente original, conforme gravura de época.



Concluído o sincronismo do sistema de alceamento da linha na parte inferior

A montagem foi realizada com todas as peças originais, devidamente alinhadas. Parafusos, arruelas e roscas, polidos e lubrificados, assim como as demais partes móveis.

Assim concluída, dentro dos parâmetros e exigências de nosso acervo, teve impressa e adesivada uma etiqueta similar à de identificação de fábrica.



Gateway - "A Pequena Notável"

Nosso Museu de Antigas Máquinas Manuais de Costurar recebe mais esta, devidamente restaurada, que vai integrar seu conjunto de uma centena de maquininhas de costurar infantis.

Essa pequena e linda maquininha certamente já trouxe alegria e entretenimento a alguma criança curiosa. À uma menina que hoje talvez não esteja mais entre nós, tendo cumprida sua missão terrena.

Mas acredito sim, que algum etéreo eflúvio deve ter sido agora despertado naquela garotinha, após contemplar, lá dos céus, o brinquedo renovado, como no dia em que seus olhinhos brilharam ao recebe-la presente.


Justificativa do Título

“A Pequena Notável” foi o codinome de Carmem Miranda, decorrente de sua estatura (1,52m). Nascida em Portugal em 1909, veio para o Brasil com um ano de idade, fez extraordinário sucesso aqui e nos Estados Unidos a partir de 1940 (cantora, dançarina e atriz). A pequena maquininha Gateway mereceu parodiar tal perfeito atributo nesta postagem, por indicação do Sr. Mário V. Rodrigues, valoroso entusiasta pela preservação destas preciosidades, a quem reverencio nesta citação. 

 Prof. Darlou D'Arisbo

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

As Miniaturas de Máquinas de Costurar – Publicação 44

O nosso Museu de Antigas Máquinas Manuais de Costurar (MAMC) apresenta, nesta 44ª Publicação, alguns exemplares de seu acervo de miniaturas de máquinas.  Em sua maioria, são pequenos objetos miniaturizados cujo valor pode estar agregado à pequena dimensão, formosura, detalhamento e proporcionalidade, executados pelos artífices ou, apenas pela raridade e localização de onde foi adquirido.  Assim, apresentamos alguns de nosso acervo, com suas características individuais.

Minúscula em Prata (2cm)

Confeccionada em prata por um talentoso artífice, esta maquininha mede cerca de dois centímetros e foi adquirida no seu atelier em Nápoles em 2014.

Ele nos apresentou alguns outros inimagináveis trabalhos quase microscópicos, como um presépio esculpido num grão de café e a sagrada família (Cristo e os pais) lavrados numa semente de lentilha, cujos detalhes só podem ser observados com lente de aumento.   Estava trabalhando uma inimaginável escultura num grão de arroz !

Detalhada com acessórios (3,5cm) 

Executada em metal (Zamac), com detalhes e base em mesmo material, incorpora os acessórios para montar casa de bonecas. Mede três e meio centímetros, com particularidade de insinuar estar costurando um tecido e dispor de linha e carretel. Adquirida no Hospital das Bonecas, em Lisboa em 2015.

Chinesa Singer (9cm)

Detalhadíssima miniatura de máquina Singer Family 1910, em liga metálica, com acionamento a pedal, mesa, gaveta e carretel. Dimensões nove centímetros de comprimento e dez de altura, com todas as partes minuciosamente instaladas e móveis. Adquirida em Ciudad del Este – Paraguay, em 1998. 

 

Portuguesa de bronze (4cm)
  

 

 


 


Delicadamente torneada em bronze, executada em 1960 (conforme o vendedor), agrega detalhes como volante móvel, manopla, porta carretel, fronte e eixo vertical. Medindo quatro centímetros, foi adquirida no tradicional Mercado de Santa Clara, em Lisboa.

Alemã em porcelana decorada (3,5cm)

Minúsculo enfeite de porcelana branca, com detalhes florais e dourados. Elaborado na Alemanha em 1995, com apenas três centímetros de comprimento. 

 


Italianinha decorada (3cm)
 
Elaborada em alumínio, incluindo a base, apresenta desenhos dourados no corpo e carretel de madeira com linha. Mede três centímetros e foi comprada em loja de miniaturas em Roma, em 2015.
 
 

A menor das menores (2cm)

Integrando a turma das ultrapequenas, esta miúda mede menos de dois centímetros! Fundida em liga metálica, foi adquirida numa feira de artesanato em Gramado-RS (Brasil). 

 

Já foi apontador de lápis (7cm)

A partir de um pequeno apontador de lápis em forma (made in China) de máquina de costurar, adaptei alguns acessórios como emblemas e carretel com linha.  Mede sete centímetros de comprimento. 

"Made in house" (4cm)

O conhecimento incorporado durante quatro décadas, a criatividade e a disponibilidade de peças sucateadas, permitiram-me inventar algumas maquininhas artesanais e minúsculas, executadas a partir de peças descartadas e adaptadas.

Com apenas quatro centímetros, possui a base, corpo, braço oscilante e fronte em aço. O carretel é um pequeno rebite, o volante é um botão de pressão com manopla de madeira. E a tesoura, é um ganchinho de “soutien”, aberto e adaptado.

 

Outra "made in house" (6cm)

Um pouco maior e mais completa, esta mede seis centímetros, com base e manopla em madeira, corpo, braço oscilante e fronte em aço. O volante é um grande botão de pressão. Regulador da linha, preenchedor e outras pecinhas oriundas de eletrônicos descartados.  Esta e a anterior demoraram cerca de dois anos, juntando partes e adaptando até serem concluídas.

Este grupo de miniaturas também incorpora o acervo de nosso Museu de Máquinas, com suas histórias e particularidades.

Agradeço aos que me honram sua atenção, aguardando comentários e/ou críticas que possam enriquecer nosso trabalho.

 

Pensamento do dia:

Não posso possuir o que não entendo.
Assim como não posso perder o que não tenho.
(D.D.) 
 
 
Prof. Eng. Darlou D’Arisbo
dezembro de 2023